Assistente de Terapia
- Isabel é a mulher dos meus sonhos. Jamais poderei viver longe dela. Não consigo parar de pensar nela sequer um segundo. Acho que estou enlouquecendo, não tenho mais rumo nem direção e tenho a impressão de estar perdendo os limites da sabedoria - dizia o paciente no divã do terapeuta.
Era um cara muito estranho, discordava sempre do seu terapeuta, detestava ouvir críticas e jamais chorou em qualquer sessão.
O terapeuta fazia seu papel: escutava. Mas há muito havia desistido de tentar resolver o problema daquele homem doente que insistia em dizer sempre que o terapeuta o enganava e que ele é que tinha a razão.
O terapeuta mudou de tática e agora, sempre que o paciente lhe fazia alguma pergunta, ele imediatamente respondia com outra: - O que é que você acha? – Loucura do terapeuta ou do paciente?.
O terapeuta era um profissional conceituado. O paciente, um derrotado, um fraco de espírito. Pensava em suicídio pelo simples fato de amar uma mulher.
- Quem pode querer suicidar-se por amar uma mulher? - Pensava o terapeuta. - Um maníaco depressivo...
O paciente não achava. Dizia que era perfeitamente normal e que também era normal suicidar-se. - Tantas pessoas se suicidam... – e ele teria uma causa justa: Amava uma mulher. “Isabel é a mulher dos meus sonhos", repetia. E assim o terapeuta o definia. Na lista de espera já não constava mais o seu nome e sim a frase que ele sempre dizia. E quando perguntava, sua assistente já dizia: - É Isabel, a mulher dos seus sonhos!
Que cara estranho! - exclamava o próprio terapeuta - ele que encontrara tantas loucuras no decorrer de sua profissão... Não, nunca vira nada igual! Alguém que paga uma terapia, mas não aceita que o terapeuta o ajude... Outro dia até sonhou que alguém tentava enforcá-lo dizendo “Sou Isabel, a mulher dos seus sonhos” – Mas que diabos, os sonhos não são meus! E eu nem sei quem é e nem nuca vi Isabel. – O terapeuta, que a esta altura já andava se consultando com seus amigos, de uma hora para outra resolveu:
– Não vou mais lhe consultar.
– Mas, por quê? – Perguntou o paciente, no auge de sua angústia.
– Não posso.
– Não entendo. Eu não lhe pago tudo em dia? Não venho sempre às consultas? Não chego sempre nas horas marcadas? Por que então não me consulta?
– Porque você não tem cura. Você não me ouve, está sempre correto, é médico de si mesmo. Eu então não posso ajudá-lo! Para curá-lo, é preciso que você me ouça. Coisa que eu estou tentando fazer há um ano e até agora não consegui. Olha, amigo, estou fazendo isto porque não sou picareta. Poderia ficar recebendo seu dinheiro, mas não! Estou lhe devolvendo: Um ano de consulta. Procure outro médico, alguém que lhe entenda. Até indico um: Amigo meu. É picareta. Vai lhe ser mais útil e bastante compreensivo. – Anotou o endereço num bloco, arrancou a folha e lhe deu.
– Mas doutor, há um ano me consulto com o senhor! Com outro médico eu não vou me acostumar.
– Vai sim, tenha certeza.
Passou-se um ano e o terapeuta continuou em sua rotina atendendo aos pacientes e volta e meia a alguns malucos como o “Isabel”, mas estes ele tratava logo de dispensar. Certo dia, repentinamente, aparece sua assistente e lhe diz:
- Doutor, o senhor não vai acreditar!
– O que? – retrucou o médico
– Adivinha quem veio hoje se consultar?
– Quem?
– Isabel, a mulher dos seus sonhos!
– Mas isto é um pesadelo! Que foi que deu na cabeça desse maluco pra me procurar? Diga que não estou, vá!
– Desculpe doutor, mas ele insiste em dizer que quer ver o senhor urgentemente. Disse que está curado.
– O que? Curado?
– É sim senhor.
– E qual estado clínico dele? Está babando ou coisa assim?
– Não, não está não senhor.
– Caçando mosca?
– Também não.
– Hum... sei... (e parou um instante para pensar...) Então, mande-o entrar.
Tal qual não foi a surpresa do médico ao ver entrar na sala um sujeito limpo, de cabelos muito bem penteados, vestido numa roupa impecável e com uma mulher sensacional ao seu lado: morena, um metro setenta e cinco, pelos cálculos, olhos verdes, cabelos negros, salto alto, coxas grossas e...
– Doutor! Como está?
– Ah, seu Isabel!!! Como vai?
– O senhor me desculpe, doutor, mas Isabel é ela: Minha mulher.
– Ah, mas é claro... Isabel... Então é por sua causa que... Venha, sente-se, Frederico. Vamos conversar.
Durante quase uma hora o doutor se pôs a escutá-lo olhando nos olhos verdes de Isabel que, por dentro, o estremecia sem parar.
Isabel era daquelas mulheres devassas, que adoram uma fantasia. Era casada com Frederico pelo dinheiro, mas pulava a cerca quase todo dia.
Quando Frederico tomava conhecimento, ficava furioso e em seguida deprimido, mas passava logo, sempre que Isabel se redimia. Sonhava com Isabel todos os dias e para o controle disto é que iniciara o tratamento. Estava com este médico desde o princípio. Só depois, a conselho dele, é que se tratou com o outro: o amigo. No meio da conversa, Frederico sentiu vontade de ir ao banheiro. Pediu licença ao médico e retirou-se do recinto. A deixa era preciosa, não se podia negar o valor daquele instante: Estava o médico sozinho, na sala, com uma mulher lindíssima: A mulher do ex-louco, seu paciente.
Iniciou-se então a troca de charmes, que não se alastrou por muito tempo. Quando Frederico adentrou novamente à sala, estava o médico aos beijos com Isabel, a mulher de seus sonhos, em cima da mesa em que atendia. Frederico então ficou inteiramente possesso e sacando uma arma disse para o médico:
- Você agora vai receber o dinheiro da consulta!
E atirou certeiramente no terapeuta. O médico caiu morto no chão. O barulho estrondoso do tiro chamou a atenção de toda a clínica. Logo entrou a atendente que, gritando e chorando muito, pôs o médico nos braços e tratou de verificar sua freqüência cardíaca. Desesperada, ao constatar sua morte, ela xingou Frederico de louco e numa voz engasgada gritou:
- O que eu faço agora, meu Deus?
Frederico, de forma muita calma, disse:
- Enterra. Mas antes mande fazer uma lápide por mim: "Aqui jaz esse médico. Com carinho: Isabel - Assistente de Terapia."
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